Mulheres Viajantes: NY além de Manhattan ~ Luciara Ribeiro

Toda vez que vou realizar uma viagem costumo passar alguns dias planejando e organizar roteiros. Costumo ler sites turísticos, guias de viagem, pedir dicas para amigos, ver vídeos na internet, etc. A questão é que, geralmente, os lugares indicados através de todos esses canais são sempre os mesmos.

Coincidência, ou não, mas há muitas semelhanças entre esses espaços. Geralmente, esses fazem parte da história oficial da região e estando em sua maioria concentrados em regiões nobres, centrais e/ou elitistas.

É importante termos em mente que espaços turísticos representam apenas uma parte da história cultural de uma cidade. Mas como uma espaço passa a ser visto como turístico? Como se consagra algo a símbolos turísticos?

Ao visitar Nova Iorque, em junho de 2016, eu me propus a fazer um turismo diferente. Anotei os lugares e as dicas dos guias de viagem em um caderno, e deixei de lado. Depois comecei a pesquisar e ler sobre a história da cidade, sua organização, seus movimentos e eventos em mídias alternativas. Anotei tudo em outro caderno.

A partir de então, passei a perceber que NY é uma cidade marcada por histórias de populações latino-americanas, afro-americanas, asiática, árabes e africanas. E, que há muitos lugares que contam essas histórias e ocupações, assim como há muitos lugares que não as contam.

Quando pensamos em passeios turísticos em Nova Iorque, lembramos sempre de espaços como Central Park, MoMa, Empire State Building, a Estátua da Liberdade, a Times Square, etc.  Todos esses lugares são interessantes de serem vistos, porém, eles não são os únicos que merecem ser visitados. Eu, como afro-brasileira negra buscava encontrar em NY também referências afro-americanas e latino-americanas, pois sabia que aquela era uma cidade também de população negra e imigrante. Sabia que aquela era uma cidade de marcos na luta de movimentos negros e latinos pela igualdade.

Em geral, esses espaços estão localizados em Manhattan, uma das zonas que compõem a cidade e onde se concentra grande parte de sua elite. Quando eu perguntava para as pessoas o que havia para visitar nas periferias da cidade, as respostas giravam em torno de comentários como: “Não tem coisas muito interessantes lá”, “Algumas zonas são perigosas”, “Lá só tem moradias”, entre outras.

Ao chegar em Nova Iorque organizei meus dias de modo que mesclava visita aos “típicos espaços turísticos” anotados no primeiro caderno e os espaços turísticos não-oficiais anotados no segundo caderno.

No Quenns, caminhei pela região de Forest Hills’, de Jackson Heights, uma região onde a maioria da população é descendente de imigrantes asiáticos e latino-americanos. Em suas ruas, há diversos restaurantes com comidas típicas de diversos países da América Latina. Eu fiquei fascinada com aquela grande diversidade e qualidade gastronômica.

No Brooklyn, visitei diversos lugares, como as ruas de Bedford Stuyvessant (abreviado: Bed Stuy), o bairro onde viveu Cris Rock viveu, e onde foi gravado o seriado “Todo mundo odeia o Cris”, umas das séries de tv que eu mais gosto.

No Bronx, visitei o Harlem, um lugar singular e especial. Não há como falar da história afro-americana sem falar do Harlem. Uma das principais ruas do bairro, a Martin Luther King Avenue e a Malcon X Avenue são verdadeiros monumentos históricos. São inúmeras igrejas negras, clubes de Jazz, etc. Esse foi o cenário de uma dos maiores movimentos políticos do século XX: a luta pelos direitos civis da população negra nos Estados Unidos.

Apesar do pouco tempo que tive em NY, eu consegui conhecer uma cidade múltipla e diversa, é um espaço de resistência e transformações.

Muitas zonas do Queens, Brooklyn e Bronx continuam sendo marginalizadas e esquecidas pelo turístico. Esse também é parte de um processo de desumanização que sofrem as regiões periféricas no mundo. Isso não ocorre apenas em NY, está presente em quase todas as cidades. Foi importante eu ter visitado NY para além das fronteiras de Manhatthan. Pude perceber a importância de realizar nossas próprias pesquisas e não ficar presa ao olhar já construído e orquestrado pela indústria racista e classista do turismo.   Convido a todas para criarmos nossos próprios roteiros quando viajarmos. Não podemos deixar que histórias e espaços que constituem a cidade e sua história sejam esquecidos.

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