Beleza na estrada

Estava eu vendo os canais de vlogs de viagem que eu curto muito e me deparei com um vídeo que trazia no título a ideia de como se manter limpo e arrumado na estrada. Faz parte de uma série de vídeos que eles contam como é viver viajando e em um motorhome, sendo um nômade digital. Não vou citar o nome do canal, pois de forma alguma quero expô-los. Adoro o trabalho deles, mas a minha crítica é mais estrutural.

Em um certo trecho do vídeo, depois de apresentar todas as nécessaires com produtos de higiene pessoal, cremes, aparelhos e maquiagens, ela nos conta que poucos meses depois de começar a viajar, estava se sentindo mal, desanimada e começou a refletir sobre o porquê. A conclusão é que ela estava se sentindo desleixada, pois não se maquiava mais todos os dias como fazia no Brasil. Apenas usava corretivo nos olhos. Falar que ela se sentia desleixada e o que faltava para ela se sentir bem consigo mesma, soou pra vlogger incômodo. Então, ela pontuou que não se maquiava por conta do trabalho em escritório, para agradar as pessoas do seu círculo social ou porque tinha vergonha de si. O maquiar-se era um ritual que a fazia feliz, a sensação de que ela estava se cuidando. Essa fala foi logo depois de mostrar uma bolsa grande só de maquiagens, com paletas de sombras e blushes.

A priori, a minha reflexão foi sobre os meus próprios hábitos. Poxa, eu Thaís, sou desleixada mesmo. Dificilmente, eu uso maquiagem no meu cotidiano e raramente, uso no meu trabalho. Para mim, a maquiagem muitas vezes tem a ver com festividades, quando quero disfarçar algo em mim ou quando eu acordei inspirada e fico pensando que usar a make vai me fazer chegar arrasando em algum lugar.

A questão é que o pensamento dela e o meu sobre cuidado de si e maquiagem, apesar de distintos, eles não partem apenas da nossa opinião. As nossas escolhas são parte de uma estrutura cultural. É cultural nós, mulheres, usarmos maquiagem. Quando os homens se maqueiam, há toda uma chacota social por isso, pois eles estão se tornando “mulherzinhas”. Afinal, se identificar como uma mulher é algo que demonstra inferioridade. Um toque de misoginia no nosso cotidiano.

Quando viajo, sinto uma certa liberdade por não ter que me preocupar com certos códigos que só fazem sentido em São Paulo, a metrópole que engole, para mim. Ir à praia, por exemplo, é sinal de que eu não preciso fazer esforço nenhum pra colocar uma maquiagem que vai derreter na minha pele e arder os meus olhos, brincos que irão pesar. Coloco o que me deixa mais livre.  Isto vai muito do fato que os anos pesquisando e lendo sobre feminismo e outros assuntos em relação a este, me fizeram rever vários pontos. Porém, isto não significa que os padrões de beleza não ajam sobre mim de forma dolorosa muitas vezes.

Mas afinal, o que faz alguém entender como cuidado de si, o uso da maquiagem em um espaço que é o do inseguro, da constante transformação, do desgaste físico, das possibilidades e das surpresas? O que dos nossos valores e padrões permanece na estrada?

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